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UM ANO DO PROJETO HÃMHI: O QUE MUDOU?



No dia 13 de junho 2024, foi realizado o Seminário de avaliação do primeiro ano do Projeto Hãmhi|Terra Viva, que vem sendo executado pelo Instituto Opaoká, com apoio da Plataforma Semente, uma iniciativa do CAOMA-MPMG. Em 01 de junho de 2024 o projeto completou um ano de atuação.


Trata-se da formação de 30 agentes agroflorestais do povo Tikmũ'ũn, que implementam quintais agroflorestais e atuam na restauração florestal nos cinco territórios Tikmũ'ũn localizados nos municípios de Ladainha, Teófilo Otoni, Bertópolis e Santa Helena de Minas.


Os Tikmũ'ũn são uma população de 2585 pessoas, segundo dados do Sistema de Informação da Atenção à Saúde Indígena do Distrito Sanitário Indígena (SIASI-DSEI) com base em dados de janeiro 2024.  Falam a língua Maxakali, uma das últimas da família linguística maxakali. A excepcionalidade destes povos é motivo de estudos linguísticos, antropológicos, musicológicos, e hoje o IEPHA  e a UFMG realizam um processo de registro de seu patrimônio intitulado: DOCUMENTAÇÃO E PRESERVAÇÃO DO SISTEMA ANCESTRAL DE CONHECIMENTOS.


Apesar de atraírem tanto interesse de estudiosos, os Tikmũ'ũn são uma população de extrema vulnerabilidade, com alto índice de mortalidade infantil e baixa expectativa de vida quando considerado o conjunto da população brasileira. 


Os gráficos a seguir, produzidos a partir de dados do SIASI-DSEI e do Censo de 2022 (IBGE), demonstram como, a partir da faixa de 20 anos, o número desta população decresce vertiginosamente, indicando alta mortalidade após 40 anos. Levando-se em conta a população das cidades onde as aldeias maxakalis estão inseridas, tem-se uma situação oposta, sendo que na  faixa etária de 20 anos o número populacional se estabiliza e, a partir de 40 anos, cresce significativamente. 


Gráficos elaborados por Wagner Oda a partir de dados do SIM-MS


Nos gráficos abaixo, são comparadas a mortalidade proporcional à faixa etária da população indígena e as populações restantes no Brasil, em Minas Gerais, e nos quatro municípios onde se situam as aldeias Tikmũ'ũn. 


Enquanto a mortalidade em menores de um ano, nos 4 municípios citados, é de 2,5%, entre os Tikmũ'ũn ela é de 25%. Dez vezes maior!


Aos 20 anos anos, a mortalidade é de 10% entre os Tikmũ'ũn enquanto nos municípios ela é de 2,5. A baixa mortalidade após 50 anos entre os Tikmũ'ũn expressa, muito provavelmente, o fato de que poucos sobrevivem..


Gráficos elaborados por Wagner Oda a partir de dados do SIM-MS


Um complexo histórico de genocídio e violências territoriais e ambientais deve ser levado em conta para enfrentar este cenário de grave vulnerabilidade, insegurança alimentar, insegurança hídrica e racismo.



O QUE MUDOU EM UM ANO DE PROJETO HÃMHI|TERRA VIVA?


Ao fim do primeiro ano de execução do Projeto Hãmhi-Terra Viva já é possível visualizar  o que mudou neste contexto e  as perspectivas reais de inverter esta curva de mortalidade entre crianças e jovens Tikmũ'ũn, melhorar a qualidade de vida e recuperar o meio ambiente.



Acervo: projeto Hãmhi


Antes sem perspectivas de trabalho ou de engajamento em atividades que viabilizem um futuro, os jovens vivem hoje o encantamento com a possibilidade do trabalho, da troca justa e da  produção de alimentos: abóbora, batatas, maxixe, milho, quiabo, andu, mandiocas, melancias. As bananas, os cajus e as goiabas começam a dar sinal de breve produção.


Muitas culturas trimestrais já produziram, modificando a realidade da completa dependência do entorno no aspecto da produção e aquisição de alimentos. O projeto já gerou distribuição de alimentos e renda dentro das aldeias, com a promoção dos jovens agentes agroflorestais e das viveiristas.






Fotos: João Duro Maxakali


Antes isolados de qualquer possibilidade de inserção mercadológica, em função da singularidade linguística, da falta de acesso ao transporte, da falta de perspectiva de formação técnica em qualquer área e da distância dos centros urbanos, os jovens Tikmũ'ũn vislumbram a possibilidade de serem inseridos no mercado de trabalho, uma vez que o projeto leva uma formação técnica para dentro do território, uma verdadeira inovação junto aos Tikmũ'ũn, nunca realizada pelas sucessivas gestões públicas.


Outro impacto importante é a valorização do conhecimento dos mais velhos que vem sendo compartilhado com os jovens durante as práticas agroflorestais,  revertendo  a violência imposta pela ditadura militar, que proibiu os Tikmũ'ũn de praticarem seus cultivos tradicionais para servir em regime de semi-escravidão nas agriculturas extensivas que concluiram o processo de desmatamento do seu território e implantação do capim.


A paisagem do território, onde antes predominava o capim colonião, em apenas um ano já contava em junho 2023 com


56,95 hectares de reflorestamento implementados

38,4 hectares de quintais implementados

totalizando 95,35 hectares de plantios

quase  23 mil  mudas de bananas plantadas

mais de 56 mil mudas de arbóreas plantadas

3 viveiros-escolas construídos com cerca de 25 mil mudas

27 viveiros individuais construídos


Com o êxito da implantação dos sistemas agroflorestais que já se estabeleceram, estes jovens  têm o potencial de se tornarem os maiores produtores de fruticultura da região, totalmente carente de cultivos de alimentos e frutíferas. O comércio vizinho já começou a comprar alimentos produzidos pelos jovens agentes agroflorestais, que já se organizam para criar formas associativas com vistas a acessar não apenas o comércio local, mas principalmente o mercado institucional, como o PAA e o PNAE. Passar de recebedores de cestas básicas para doadores de alimento é uma grande mudança que se desenha num futuro próximo e que tem efeitos enormes na autoestima e na autonomia dos Tikmu'un, além de diminuir os efeitos do racismo e preconceito contra eles em seu entorno.  


A equipe do Projeto Hãmhi|Terra Viva sempre teve consciência de que o trabalho de  transformar séculos de violências étnicas e ambientais demandaria pelo menos vinte anos. Mas as transformações já aparecem neste primeiro ano e são  promissoras.


Agraé Maxakali. Foto: Julia Guedes


Roberto Maxakali e comunidade de Água Boa.

Mutirão na Aldeia Amaxux. Foto: Equipe Hãmhi

Viveiristas de Água Boa. Foto: Equipe Hãmhi

Vandael Maxakali. TI Maxakali do Pradinho. Foto: João Duro Maxakali

Colheitas dos agentes agroflorestais. Foto: Equipe Hãmhi

Colheitas dos agente agroflorestal Vandael Maxakali. Foto: João Duro Maxakali

Colheitas dos agente agroflorestal Vandael Maxakali. Foto: João Duro Maxakali


Badé Maxakali e Joelson Ferreira. Foto: Equipe Hãmhi








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